segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Leviano - perdemos um amigo













Penso que o Leviano era um daqueles cavalos de quem toda a gente gostava. Bonito, cheio de espírito, era um cavalo com carisma e com uma alma muito nobre.
Foram muitos os cavaleiros que, com ele, aprenderam a saltar. Recentemente, participou no Exame de Sela 7.
Para quem só conhecia este amigo das lições, deixem-me contar que este cavalo já fez de tudo! Há uns anos atrás, com o nosso professor, fazia provas de 1.20m, concurso completo de equitação (cce) e, no campo, era um Senhor. Não tinha medo de nada!
O Leviano era um cavalo forte e cheio de vida. Certo dia, depois de umas gravações para um anúncio publicitário, o Luís e o Leviano vinham calmamente pela estrada, de regresso ao centro hípico. Pelo caminho havia uma ponte de madeira, que começaram a atravessar. Acontece que a ponte abateu e o Leviano ficou com as pernas entaladas entre as tábuas de madeira. O Luís, aflito, tentou acalmar o cavalo enquanto tentava, em vão, libertá-lo dali. Acontece que a ponte abateu, e com ela caiu o Leviano. Em pânico, o Luís desceu para socorrer o seu amigo que, dorido, estava entre os escombros, sem se conseguir levantar. Com a ajuda do Luís, o Leviano pôs-se de pé e, juntos, afastaram-se das muitas tábuas agressivas de cavilhas viradas para cima. Poderia ter sido fatal, mas não foi. Ambos ficaram com arranhões e dores para alguns dias, mas o que é facto é que voltaram juntos para casa, desta vez lado a lado, como bons amigos que eram.
Mais tarde, já em Alfeizerão, uma vez saí com o Leviano, para acompanhar um grupo de pessoas que nunca tinha andado a cavalo, algumas das quais crianças. A dada altura vemos um cavalo correr para nós como um louco, sem ninguém em cima. Era de uma casa vizinha ao centro. O animal derrubou a vedação de arame farpado e corria, agora, na nossa direcção. Na nossa não, na da Princesa, que estava com o cio. O cavalo era garanhão!
Prontamente mandei o grupo seguir em frente e corri na direcção do cavalo. Felizmente o Leviano foi um herói à altura desta situação. Desta e de todas as outras. Assumiu claramente o comando e percebeu o perigo que era se aquele cavalo passasse por nós. Levantou-se e, de mãos no ar, lutou bravamente como fazem os cavalos selvagens. Mordeu o agressor e nunca, mas nunca, me deixou cair. Esta luta durou uns dez minutos e valeu ao Leviano alguns arranhões mas, verdade seja dita, haviam de ver como ficou o outro. Quando o dono deu pela algazarra e o veio buscar, já ele estava um bocado maltratado. Então nós, eu e o Leviano, fomos buscar o resto do grupo. Transpirado, cansado, o Leviano voltou a assumir a função de guia e trouxe todos, em segurança, até casa.
Para além de herói, o Leviano era também o meu confidente. Talvez, fora da família, o meu melhor amigo. Sempre que me sentia mais triste ou chateada, pegava no Leviano e ía passear com ele para o pinhal. Umas vezes falava, dizia tudo o que me ía na alma. Outras não, ficava calada e ele respeitava o meu silêncio. Sempre, mas sempre, me percebeu. Posso não conseguir explicar, mas tenho a certeza disso.
Na sexta-feira, dia 14 de Dezembro, morreu durante o transporte para o Centro Hípico do Montebelo. Ninguém sabe como nem porquê, caíu no camião e, apesar de em poucos segundos, estarmos junto dele, não conseguimos evitar o pior. Apesar dos nossos esforços em pô-lo de pé, ele não reagiu. Ainda estava vivo quando lhe peguei na cabeça e lhe fiz uma festa. A última, pois deixou de respirar logo a seguir. Morreu da mesma forma que viveu, como um herói. Sem queixas nem fitas. Simplesmente deixou-se ficar, rodeado pelos amigos de quem tanto gostava. É certo que nunca me esquecerei da sua última imagem, mas fico contente por ter sido uma morte rápida e por eu ter estado lá no momento em que se despediu desta vida.
Sabem, o nosso amigo Coronel Cabedo um dia escreveu texto muito bonito em que dizia acreditar na existência de um céu para cavalos. Eu também acredito, e sei que o Leviano está lá, “agora mais feliz que nunca, galopando, galopando, por essas planícies eternas onde as quedas não doem. Eu tentarei acompanhá-lo aqui, onde as quedas doem e os corações se partem”.
Obrigada por tudo!
Ana